segunda-feira, 10 de outubro de 2011
Com filhos, difícil é estar só...
Mãe nunca está só. Pelo menos mães de crianças pequenas. Onde a gente vai,
tem pequeno atrás. Por isso, quando li a história tragicômica da irmã da Margarida presa dez horas no banheiro, pensei “eu jamais passaria por isso porque sequer consigo ir ao banheiro sozinha!”. Tranca a porta, ué, você me diz. Eu até tranco, de vez em quando, mas quando rabicho vem atrás a gente não fecha a porta no próprio rabo. E se tranco, tampouco fico isolada. Aparecem bilhetinhos sob a porta, brinquedinhos, cabelos…Você leu certo, aparecem mechas de cabelos pretos e lisos sob a porta.
“Letícia, LEVANTA DO CHÃO!”, minha voz ecoa, debaixo do chuveiro, e a risadinha vai se afastando da porta.
No parto, quando cortam o cordão umbilical, a natureza compensa a agressão imantando a criança e fazendo da mãe um pólo magnético. Só descobrimos isso na prática, ao perceber que aquele bebê vai crescer mas continuará preso à gente, nos seguindo por onde vamos, ou sendo levado para toda parte.
Você está de licença maternidade, cheirando a golfadas e com olheiras no pé, torcendo para chegar o exército da salvação. Mas aí você resolve se arrumar um pouquinho antes que seu exército chegue, ora, o marido não é obrigado a te encontrar desse jeito todo dia. Você esqueceu de combinar com a criança, lógico, que não dorme e a hora passa! Qual a saída? Amarrar o filho no bebê conforto e deixar ele lá no banheiro de platéia enquanto você toma banho rapidinho. Olha o hábito fazendo o monge, desde pequeno.
Você está só em casa, e tem um bebê que engatinha pra lá e pra cá. De repente, a necessidade urgente de ir ao banheiro. O jeito é levar o neném contigo e fechar a porta para ele não fugir. Simples assim. Se bobear, você ainda segura ele no colo enquanto dá conta do que tem que fazer. Isso ninguém mostra nos comerciais de margarina.
- Eu quelo vê você fazê xixi!
Essa aí é minha filha Carolina, de 2 anos, deixando claro o que prefere fazer de manhã, logo após me acordar, em vez de me esperar deitadinha na cama. Pegaria bem acrescentar essa cena ao comercial das minhas manhãs felizes? No banheiro, ela fica se esgueirando na parede em busca de um assunto qualquer para conversar. Rola um papo cabeça, às vezes.
- A minha cabeça não sai – ela diz, apertando as orelhas com as duas mãozinhas, como quem tenta desatarrachar a cabeça do pescoço.
- Não, filha, só a cabeça da Poly, que você arranca. Por que você arranca as cabeças da Poly?
- Porque ela pode nadar sem cabeça.
- Claro, por que nunca pensei nisso antes?
E lá vamos nós juntas para a cozinha sonolenta, dividir tarefas da manhã preguiçosa: eu me encarrego das frutas e do leite, enquanto ela derrama farinha láctea (ou melhor, “lática“) dentro e fora do copo, antes de eu bater tudo com o mix. Sentadas no sofá, silenciosas e cúmplices, ela mama, e eu espero, até aparecer o resto da família, e a gente brincar, eu sair para trabalhar etc.
Essa companhia constante, espontânea e gratuita é, em resumo, o que acontece boa parte do meu tempo em casa, do momento em que acordo até a hora em que elas se deitam. Filhos foram a inspiração primitiva do Twitter porque são seguidores fiéis e incondicionais.
Tenho plena noção de que esse interesse incondicional tem prazo de validade. À medida que crescem e estabelecem vínculos sociais mais fortes, o mundo ganha atrativos. É assim que deve ser e assim será.
Enquanto isso, aproveito o melhor dessa ausência forçada de solidão porque mãe é assim: não tem sossego nem pra tomar banho. Uma falta de paz que torna tudo mais divertido e engraçado, à exceção, claro, daquele dia em que, de TPM, você vai reclamar que não consegue fazer nada sozinha _ nem ler jornal!! _ quando o coitado do marido parar rapidinho do seu lado para checar a manchete da primeira página.
Talvez por estar ciente da temporariedade disso tudo, eu tenha me acostumado com a ideia de não trancar mais as portas por onde passo. A luz da infância que projeta minhas pequenas sombras é como o alvorecer de um dia. Quando o sol estiver a pino, não as perceberemos mais, embora elas estejam lá. Por isso, abro mão da solidão para, vez ou outra, ser observada por uma curiosa platéia-mirim atrás do vidro embaçado do meu chuveiro, enquanto tomo banho. Observá-las ali é uma troca, que diz muito sobre mim mesma.
Dia desses de manhã, em que uma virose sem nome veio me arrasar, Carol, a pequenininha, chegou no nosso quarto para dar bom dia, como faz sempre, mas saiu de lá com o pai. Ainda com a testa doendo e as pernas pesando demais, ri sozinha ao ouvir, de longe, o seguinte diálogo:
- Vem, Carol, deixa mamãe dormir porque ela tá meio dodói – sussurrou o pai.
- Eu quelo vê a mamãe mimindo – respondeu a criança, impaciente.
- Mamãe tá tossindo, ó, precisa descansar.
- Eu quelo vê a mamãe tossindo!
Entendeu o que eu quis dizer? Se depender delas…mamãe nem sequer tossirá sozinha. E isso é muito, muito bom.
Fonte Mulher 7x7: http://colunas.epoca.globo.com/mulher7por7/2011/10/10/com-filhos-dificil-e-estar-so/
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